Na noite desta quarta-feira (29), a Câmara de Macaé discutiu com autoridades, acadêmicos e representantes de diversas religiões a importância de se combater atos de intolerância motivados pela crença que cada cidadão escolhe seguir. A audiência pública foi solicitada pelo Professor Michel (Patriota) e também contou com as participações de Iza Vicente (Rede), Luiz Matos (Republicanos) e Tico Jardim (Pros).
Um dos momentos mais emocionantes aconteceu quando a manicure Vivian Bruna Braes foi chamada ao púlpito. No último dia 23 de abril, Dia de São Jorge, ela ouvia uma música em homenagem ao padroeiro do estado dentro de sua casa, no Lagomar, e logo começou a ser atacada verbalmente por um vizinho. Depois de xingamentos e falas de que não gostaria de ouvir “música de macumba”, ele atingiu Vivian com um facão e ela acabou perdendo a visão de um dos olhos.
O caso ganhou repercussão nacional e o acusado está foragido, mesmo com mandado de prisão expedido pela polícia. “Para estar aqui hoje e falar, tranquila… Nossa! Só o meu esposo sabe. Foram muitas lágrimas que derramei toda vez que olhava no espelho e pensava: perdi a minha vista por conta da minha fé. Pensei em parar, desanimar, mas percebi que tudo ganhou uma proporção muito grande. Hoje, luto pela fé e pelo axé de todos”, disse Vivian.
Imediatamente, Professor Michel se posicionou. “Você não está sozinha, saiba disso”. No início do mês, o vereador esteve com Iza em uma caminhada contra a intolerância, no Centro, que foi organizada por diversos líderes religiosos. “A Alerj realizou uma CPI para investigar crimes por intolerância e chegou a números mais do que alarmantes. Nacionalmente, 75% das vítimas estão ligadas às matrizes africanas. Se olharmos apenas para o nosso estado, as estatísticas ultrapassam 90%.”
Uma causa coletiva
Michel também reforça que a causa deve ser coletiva. “Independe de lado, partido ou religião. Temos essa garantia constitucional. A Câmara reafirmou isso ao aprovar, de forma unânime, a realização da audiência”, disse.
Evangélica, Iza defende que os cristãos precisam reconhecer os privilégios existentes. “Tranquilamente, conseguimos autorizações para eventos em praça, sem falar dos apoios institucionais. Nem sempre o mesmo acontece para quem pratica outra religião. Falo pouco sobre a minha porque sei que fui eleita para representar toda a cidade.”
A parlamentar ainda citou metas que devem ser buscadas pelo Legislativo, como a institucionalização dos terreiros de umbanda e candomblé. “Com um CNPJ, será possível participar de ações públicas, além de benefícios fiscais que outros templos têm direito. Também é urgente criarmos o Observatório da Liberdade Religiosa, que nos permitirá acompanhar de perto casos de intolerância, além de um conselho municipal com paridade de representação”, acrescentou.
Ações do Executivo
Há poucos meses, o prefeito Welberth Rezende (Cidadania) criou a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, que tem no comando Zoraia Braz Dias. Ela anunciou o lançamento do Disque-Racismo para receber denúncias, que começa a funcionar a partir do próximo dia 25 de julho. “Também buscamos convênio com a Defensoria Pública para ampliarmos as políticas de governo.”
Participação dos religiosos
Pastor da Igreja Batista Memorial, Frederico Antunes Cardoso dos Reis reafirmou que a liberdade não deve ficar restrita a um credo. “Todos devemos ter acesso à cultura, saúde, educação e liberdade de culto. Queremos paz. Não é medo que devemos produzir enquanto sociedade”. Ao encerrar a fala, ele pediu desculpas à Vivian em nome de todos os demais religiosos e a abraçou.
O Coletivo de Juventude Negra (Enegrecer) esteve presente na audiência. Uma das coordenadoras, Dara Sant’Anna enfatizou que os movimentos precisam estar organizados. “Nós, que temos comprometimento real com a liberdade e a vida, precisamos estar atentos. É urgente disputarmos os espaços de poder, pois os nossos corpos negros não podem continuar tombando sem nenhuma punibilidade. Uma das coisas mais graves é ver mães perdendo a guarda dos seus filhos por levá-los aos cultos nos terreiros.”
Luiz Matos, que também é pastor, defendeu que intolerantes sejam punidos ao rigor da lei. “Repudio qualquer ato de violência contra qualquer tipo de religião. A minha fé independe da denominação da qual participo”, frisou.
Líderes católicos, espíritas e praticantes do budismo também se manifestaram. Para conferir a íntegra da audiência, acesse o link abaixo: